No dia 17/12/2024, a Câmara dos Deputados aprovou o principal projeto de regulamentação da reforma tributária, o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº. 68/2024, em complemento à Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023, que reorganiza sobretudo os tributos que incidem sobre o consumo, com objetivo de simplificar o sistema tributário nacional.
Com a criação do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS), teremos a extinção gradativa do ICMS e ISSQN, ao passo que a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) substituíra as contribuições destinadas ao PIS e à Cofins, bem como o IPI, com a promessa de garantir transparência, estimular a produtividade e a competitividade no mercado nacional, com potencial para reduzir custos embutidos nos produtos e serviços, beneficiando os consumidores. Há estimativas que apontam um potencial de majoração de até 10% (dez por cento) do PIB na próxima década a partir dos benefícios da reforma.
Além disso, haverá a instituição de um Imposto Seletivo (IS) com o objetivo principal de desestimular o consumo de produtos e serviços considerados prejudiciais à saúde, ao meio ambiente ou socialmente indesejáveis.
Das regras gerais dos novos tributos.
Com a transformação do projeto em Lei Complementar e a criação de novos tributos, cabe destacar os principais aspectos do IBS e da CBS.
Em relação ao fato gerador, o IBS e a CBS incidirão sobre operações onerosas com bens ou com serviços, bem como sobre algumas operações não onerosas com bens ou com serviços expressamente elencadas na legislação complementar.
O §1º do PLP nº 68/2024 define a operação onerosa como aquela que envolve qualquer fornecimento com contraprestação, incluindo o decorrente de compra e venda, troca ou permuta, dação em pagamento, prestação de serviços, dentre outros.
A base de cálculo do IBS e da CBS é o valor da operação, salvo disposição em contrário prevista na referida lei complementar. O valor da operação, por sua vez, compreende o valor integral cobrado pelo fornecedor a qualquer título, incluindo ainda os valores correspondentes a acréscimos a título de juros, multas, acréscimos e encargos, descontos concedidos sob condição, dentre outros.
Por outro lado, cabe destacar que há previsão expressa de que o IBS e a CBS não integram as suas próprias bases de cálculo. Da mesma forma, não integram a base imponível destes novos tributos o IPI e descontos incondicionais, os reembolsos ou ressarcimentos recebidos por valores pagos relativos a operações por conta e ordem ou em nome de terceiros, desde que a documentação fiscal relativa a essas operações seja emitida em nome do terceiro.
O IBS e a CBS obedecerão ao princípio da não cumulatividade, que visa evitar a tributação em cascata ao longo das operações. A previsão foi estabelecida pela própria EC nº 132/23, que incluiu os art. 149-B e art. 156-A ao texto constitucional.
Todavia, há que se destacar que há limitação ao aproveitamento de créditos em operações em que existe exigência de tributo. São elas: (i) nas operações com bens materiais ou imateriais considerados “de uso ou consumo pessoal” e (ii) nas hipóteses previstas na Constituição.
Além disso, as operações isentas ou imunes não darão direito ao crédito, nos termos do 156-A, parágrafo 7º, inciso I da Constituição, que dispõe que a isenção e a imunidade não implicarão crédito para compensação com o montante devido nas operações seguintes.
No que concerne às alíquotas, estas serão fixadas por lei específica de cada ente federativo, cumprindo asseverar que à União competirá a alíquota da CBS. Já cada Estado, cada Município e o Distrito Federal deverão estabelecer suas alíquotas do IBS.
Considerando o texto aprovado, a estimativa é de que a alíquota de referência global, isto é, da CBS e do IBS juntas, seja de 28%, acima, portanto, dos 26,5% previstos inicialmente pelo Poder Executivo.
O artigo 21 do PLP nº. 68/2024 define como contribuinte do IBS e da CBS o fornecedor que realizar operações no desenvolvimento de atividade econômica, de forma habitual ou em volume que caracterize o exercício de tal atividade, ou de forma profissional, ainda que a profissão não seja regulamentada, dentre outros expressamente previstos na legislação complementar.
Além de estabelecer o critério pessoal, o artigo 21 acima impõe aos contribuintes dos tributos, ainda que residentes ou domiciliados no exterior, a obrigação de se inscreverem nos cadastros relativos ao IBS e à CBS, esses últimos como contribuintes ou como responsáveis tributários nas importações.
No entanto, pessoas físicas com receita bruta anual inferior a R$40,5 mil; transportador de carga pessoa física, produtor rural com receita bruta anual inferior a R$3,6 milhões, entidades sem fins lucrativos que presta serviços de plano de saúde e assistência sob a modalidade de autogestão; entidades de previdência complementar fechada; fundos de investimento; e fundos patrimoniais, não se enquadram como contribuintes do IBS e da CBS.
Visando colocar um ponto final na guerra fiscal, as mercadorias e serviços serão tributados no local do consumo, de modo que o destino da operação será de fundamental importância para determinação da alíquota do IBS, assim como para a distribuição do produto de sua arrecadação.
Dessa forma, os novos tributos passam a observar o princípio da neutralidade, de modo a não impactarem nas decisões do contribuinte quanto às suas operações, como por exemplo não comprar ou comprar de empresas do Simples Nacional, ou suas decisões quanto à produção, como por exemplo, usar um insumo que não seja o melhor, mas que confere menor carga tributária, ou de comercialização, e muito menos a sua localização, para evitar conflitos entre estados e municípios.
O PLP nº. 68/2024 ainda trata dos regimes diferenciados, como os previstos para o setor financeiro, planos de saúde e bens imóveis, e prevê que plataformas digitais poderão ser responsáveis pelo recolhimento do IBS e da CBS.
Considerado o “coração” da reforma tributária, o split payment é tratado a partir do artigo 31 do PLP nº. 68/2024. Trata-se de um sistema de recolhimento do IBS e da CBS no momento da liquidação financeira da transação de pagamento por meio do qual os prestadores de serviços de pagamento deverão segregar e recolher aos cofres públicos os valores destes tributos.
Outro ponto de destaque da reforma aprovada é o chamado cashback, que consiste na devolução personalizada do IBS e CBS sobre produtos da cesta básica, além da redução dos tributos incidentes sobre serviços de energia, água, luz e esgoto e telecomunicação.
Por fim, foram aprovadas as regras do IS, de arrecadação federal e que terá caráter extrafiscal, incidindo sobre bens e serviços prejudiciais à saúde, como bebidas alcóolicas e cigarros, bem como ao meio ambiente, como veículos poluidores.
Da transição entre o sistema atual e a nova tributação.
A fase de transição entre os sistemas terá uma duração de 7 anos e ocorrerá entre 1º de janeiro de 2026 até 31 de dezembro de 2032. Nesse período, o ICMS, ISS, PIS e COFINS serão extintos de forma gradual, dando espaço para a entrada em vigor do IBS, CBS e IS.
A partir de 2026 até 2033, passaremos a conviver com a vigência simultânea de dois regimes de tributação diferentes sobre o consumo. A transição para a sociedade será iniciada em 2026 e concluída em 2033, ano em que os atuais tributos sobre o consumo serão extintos e o novo modelo estará plenamente vigente.
O ano de 2026 será de calibragem das alíquotas e testes do sistema. Neste período o IBS terá uma alíquota de 0,1% e a CBS de 0,9%, sendo que o valor recolhido de ambos os tributos poderá ser utilizado para compensar o pagamento do PIS/Cofins e de outros tributos federais.
Em 2027 se iniciará a cobrança da CBS pela alíquota cheia e haverá a extinção do PIS e da Cofins. Neste mesmo ano, as alíquotas do IPI serão reduzidas a zero, exceto para os produtos manufaturados na Zona Franca de Manaus; e será instituído o Imposto Seletivo.
De 2029 a 2032, haverá a transição do ICMS e do ISS para o IBS, com a redução gradual das alíquotas do ICMS e do ISS e o aumento gradual da alíquota do IBS, de acordo com os percentuais a seguir: 10% em 2029; 20% em 2030; 30% em 2031; e, por fim, 40% em 2032.
Em 2033, o ICMS, o IPI e o ISS serão extintos e o novo modelo entrará em vigência integralmente.
Próximos passos.
O texto aprovado foi agora encaminhado para sanção presidencial até 16/01/2024, podendo haver vetos ao texto que serão posteriormente apreciados pelo Congresso Nacional.
Assim que promulgada a Lei Complementar, caberá ao executivo e ao Comitê Gestor do IBS elaborarem ato conjunto para regulamentação da CBS e do IBS.
A equipe tributária do Portugal Vilela – Direito de Negócios está à disposição para esclarecer dúvidas e propor assessoria.