Taxação de dividendos volta ao centro do debate tributário no Brasil

Com a proposta do governo de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até dois salários-mínimos, reacende-se no cenário nacional a discussão sobre a taxação de lucros e dividendos como forma de compensar a renúncia fiscal. O tema, que envolve justiça tributária, competitividade empresarial e segurança jurídica, volta à pauta com força e gera reflexões importantes no meio jurídico e empresarial. Para entender melhor os impactos dessa possível mudança, levamos algumas dúvidas ao advogado Thiago Machado, sócio do escritório Portugal Vilela, integrante da Rede Lexnet.

A compensação fiscal proposta é viável? Há riscos para arrecadação ou investimentos?

Segundo as estimativas do governo, a compensação fiscal seria neutra, com expectativa de arrecadação superior à renúncia gerada pela isenção. O PL 1.087/2025 prevê aumento de R$34 bilhões, o que representaria R$7 bilhões a mais do que a perda com a nova faixa de isenção. Apesar disso, a proposta não contempla qualquer alívio tributário para as empresas pagadoras de dividendos — ponto que historicamente tem sido considerado em outras reformas do IR.

Esse desequilíbrio preocupa. A ausência de redutores para o IR das pessoas jurídicas e a proposta de restituição do IRPF quando a carga ultrapassar 34% sobre o lucro contábil parecem, na prática, de difícil aplicação. Isso pode desestimular investimentos, sobretudo os internacionais, em um momento em que o Brasil deveria buscar justamente o oposto: atrair capital, ampliar a base produtiva e fomentar o crescimento.

Taxação de dividendos para isentar os mais pobres é justiça tributária ou cria entraves?

Tributação de dividendos para isentar os mais pobres é justiça tributária ou cria entraves?

Do ponto de vista da justiça fiscal, isentar quem recebe até R$5 mil mensais é uma medida coerente com o princípio da capacidade contributiva. No entanto, o debate se intensifica quando olhamos para as contrapartidas. A principal crítica ao projeto não é a desoneração da base mais baixa, mas sim a forma como ela será compensada: por meio da tributação dos dividendos, sem contrapartida de redução da carga para as empresas.

Além disso, o governo federal pouco tem sinalizado sobre cortes ou racionalização de gastos públicos. A ausência de medidas voltadas à eficiência do Estado reforça a percepção de que a política fiscal está excessivamente centrada na arrecadação, o que cria insegurança para o investidor e aumenta a resistência do setor produtivo.

Existe uma faixa de tributação mais adequada?

Uma das propostas em debate, apresentada pelo senador Ciro Nogueira, eleva a faixa de isenção para R$150 mil — o que atenua os impactos sobre pequenos empresários e profissionais liberais que atuam sob regime societário. Além disso, entenderia interessante sugerir uma compensação para as empresas, algo que seria mais alinhado com reformas tributárias anteriores. É importante destacar também a necessidade de discutir a revisão de benefícios fiscais pouco eficientes, que geram perdas de cerca de R$500 bilhões por ano. O projeto atual pode atingir negativamente empreendedores que, após a Reforma Trabalhista de 2017, se organizaram sob regimes como o Simples Nacional ou Lucro Presumido, inclusive prestadores de serviços intelectuais autorizados pelo STF a submeter suas atividades à tributação corporativa pelo Supremo Tribunal Federal.  Isso reforça a urgência de um debate mais amplo, que trate da arrecadação com equilíbrio e preserve a segurança jurídica de quem opera dentro da legalidade.

Como a proposta impacta o planejamento societário e a estrutura das empresas?

A proposta exigirá a revisão de planejamentos societários já estabelecidos e também de estruturas em modelagem. Combinada com a Reforma Tributária do consumo (EC 132/2023 e LC 214/2025), a taxação de dividendos impõe uma nova realidade para o planejamento fiscal e societário. 5Será necessário revisitar estruturas de elisão fiscal, levando em conta não apenas a redação atual do projeto de lei, mas também suas possíveis alterações no Congresso. A tendência é que empresas busquem reorganizações mais eficientes para mitigar o impacto tributário, dentro dos limites legais. O momento exige atenção técnica e acompanhamento constante das movimentações legislativas.

A tributação de dividendos pode afastar investimentos internacionais?

A taxação de dividendos pode afastar investimentos internacionais?

A resposta é sim. A atual isenção de IR sobre dividendos pagos ao exterior, prevista na Lei nº 9.249/95, é um diferencial que atrai investidores estrangeiros. Ao eliminá-la, o país torna-se menos competitivo, reduzindo o retorno sobre o capital investido em empresas brasileiras — sejam elas operacionais ou veículos de investimento no mercado financeiro. Além disso, a combinação de menor rentabilidade com uma taxa básica de juros ainda elevada (em torno de 15%) e um cenário de instabilidade fiscal afasta o investidor. Isso se traduz em desvalorização de ativos, redução no apetite por papéis brasileiros e, em última instância, menor capacidade de investimento pelas próprias empresas, que podem ser levadas a distribuir mais recursos para manter seus sócios, esvaziando seus caixas e comprometendo planos de crescimento.


equipe tributária do Portugal Vilela Direito de Negócios está acompanhando de perto os desdobramentos desse projeto de lei, e sempre à disposição para esclarecer dúvidas e oferecer assessoria especializada sobre o tema.


Esse texto foi publicado originalmente na seção de artigos do site LexNet.

Autor(a):

Picture of Thiago Eustáquio Carneiro Machado

Thiago Eustáquio Carneiro Machado

Bacharel em Direito e em Ciências Contábeis pela Faculdade de Direito Milton Campos – FDMC, pós-graduado em Gestão em Negócios pelo IBMEC e em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Milton Campos.

Autor(a):

  • Thiago Eustáquio Carneiro Machado

    Bacharel em Direito e em Ciências Contábeis pela Faculdade de Direito Milton Campos – FDMC, pós-graduado em Gestão em Negócios pelo IBMEC e em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Milton Campos.

Compartilhe:

Quero saber mais sobre o tema dessa publicação?

Publicações Relacionadas

Usamos cookies para personalizar, coletar dados e melhorar sua experiência no nosso site. Para mais informações, conheça nossa Política de Privacidade.