Em dezembro de 2020, por 10 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal autorizou a obrigatoriedade da vacina contra a Covid-19 no país, vetando que a imunização ocorra por meio da força ou de constrangimento aos cidadãos, mas os ministros definiram que quem se recusar a receber as doses está sujeito a punições.
O entendimento foi firmado através do julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586 e 6587, que tratam unicamente de vacinação contra a Covid-19, e do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1267879.
Vacina e liberdade individual
O ministro Luís Roberto Barroso, relator do ARE 1267879, destacou que, embora a Constituição Federal proteja o direito de cada cidadão de manter suas convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais, os direitos da sociedade devem prevalecer sobre os direitos individuais e que as escolhas que atentem contra os direitos de terceiros são ilegítimas.
O debate sobre o parecer da Corte abrange o seguinte questionamento: as empresas podem exigir que os funcionários se imunizem contra a Covid-19? Quais as consequências cabíveis pelo descumprimento desta possível exigência?
Nos Estados Unidos, pelo menos 117 funcionários do Hospital Metodista de Houston, no Texas, entraram na Justiça contra a instituição após serem demitidos por se recusarem a tomar vacinas contra a Covid-19.
É notório que as empresas têm o dever de zelar pela saúde e segurança dos colaboradores, no entanto, seria legal esta EXIGÊNCIA?
Contudo não há consenso entre especialistas. A decisão do Supremo não deixa claro se um empregador poderá ou não demitir um funcionário que se recusa a receber o imunizante, transferindo a discussão para o judiciário.
Existem fundamentações para defender a obrigatoriedade da vacina, como por exemplo, que o empregador tem o dever de zelar pela saúde e segurança de seus empregados, e visando a proteção da saúde e bem-estar de todos os colaboradores, poderá exigir que o trabalhador se vacine.
O que diz a lei sobre vacinação obrigatória
Ainda neste cenário, alguns juristas defendem ser possível a demissão por justa causa em conformidade com o artigo 482, alínea H da CLT (ato de indisciplina ou de insubordinação).
Entretanto, sabe-se que o artigo supracitado possui requisitos que devem ser necessariamente cumpridos, como é o caso da taxatividade. Ela diz respeito àquilo que está estritamente subordinado à lei, ou seja: a aplicação do direito depende de uma previsão legal objetiva.
Logo, por não elencar a vacinação como hipótese no rol do artigo 482 da CLT, não se pode falar em demissão por justa causa.
Até o presente momento, não foi editada nenhuma lei, decreto ou medida provisória que regulamenta o tema desta forma.
Para nós, como sociedade, é de extrema importância que a população se vacine. Contudo, não se pode desconsiderar que as pessoas possuem liberdade de escolhas e crenças, há direitos norteados no direito do trabalho que existem justamente para proteger o empregado.
Como proceder em tais casos
Estes princípios, juntamente com a ideia da proporcionalidade e razoabilidade, formam uma terceira corrente, que defende que o empregado poderia ser demitido ao se recusar a tomar a vacina, porém, SEM justa causa.
Essa é uma discussão de um tema nunca vivenciado anteriormente, o que nos traz inseguranças de como proceder neste tipo de caso, e merece uma análise e ponderação delicada e meticulosa.
Atualização (22/07/2021): TRT 2 publica acórdão favorável à obrigatoriedade da vacinação
Conforme previsto, as primeiras decisões sobre este polêmico tema já começam a ser publicadas.
Em acórdão publicado em 19/07/2021, o TRT da 2ª Região legitimou a demissão por JUSTA CAUSA de uma auxiliar de limpeza hospitalar que se recusou a ser imunizada contra a COVID 19.
Para o Juízo, é dever do empregador garantir condições dignas que protejam a saúde e a integridade física de todos seus empregados: A liberdade da consciência não deve se sobrepor ao direito à vida.
Ainda, balizou sua decisão com o disposto no artigo 3º, inciso III, da Lei 13.979/20:
Art. 3º – Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas:
(…)
d) vacinação e outras medidas profiláticas.
Outros juristas entendem que, mesmo sem recorrer à legislação emergencial, a decisão é coerente: equivalem as vacinas contra COVID-19, especialmente no âmbito hospitalar, a um Equipamento de Proteção Individual (o famoso EPI), cuja recusa ao uso está tipificada na alínea b do parágrafo único do art. 158 da CLT como ato faltoso – passível de dispensa com justa causa.
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