Sempre que o assunto é inventário surge a dúvida quanto à possibilidade de renunciar a herança em benefício de algum outro herdeiro, para que outra pessoa receba a parte daquele que renunciou.
Porém, a renúncia da herança não funciona dessa forma, o que acaba causando muita confusão nos planejamentos patrimoniais e nos processos de inventário.
A renúncia propriamente dita é um ato unilateral abdicativo pelo qual o herdeiro declara, em instrumento público ou termo judicial e de maneira expressa e inequívoca, que não aceita a herança (Art. 1.806, do Código Civil). Destaca-se que a renúncia não pode estar acompanhada de condições, bem como não pode ser parcial, quanto a somente um bem, por exemplo. Quem renuncia, renuncia à herança como um todo (Art. 1.808, do Código Civil).
Renúncia abdicativa
Quando a renúncia abdicativa acontece, aquele quinhão que era, a princípio, daquele herdeiro que renunciou, retorna ao monte dos bens do falecido e será redividido entre os demais herdeiros, na proporção de seus respectivos quinhões (Art. 1.810, do Código Civil).
Logo, quando há renúncia, não se pode “destinar” aqueles bens para outro herdeiro. Se este é o objetivo, é preciso fazer uma cessão dos direitos hereditários.
A cessão dos direitos hereditários, apesar de ser chamada por alguns de renúncia translativa, não é uma renúncia, porque não obedece ao procedimento legal previsto para esta modalidade. A cessão, na verdade, pode ter condições ou encargos e, portanto, funciona como uma doação (se feita de forma gratuita) ou como uma compra e venda (se feita de forma onerosa), em que o herdeiro recebe a herança, mas doa ou vende o quinhão recebido para um terceiro.
Cessão de direitos
Para fazer uma cessão de direitos, é preciso lavrar uma escritura pública após a abertura da sucessão, indicando o beneficiário (Art. 1.793, Código Civil). A cessão não pode considerar bens individualizados, salvo se se houver autorização judicial (Art. 1.793, §2º e 3º, do Código Civil). Além disso, primeiro é preciso oferecer a cessão a um dos demais herdeiros. Somente se estes não quiserem receber o quinhão cedido é que será possível ceder a um terceiro que não faça parte da sucessão (Art. 1.794 e Art. 1795, do Código Civil).
Dessa forma, é muito importante saber a diferença entre renúncia e cessão de direitos, porque se a renúncia for feita com o objetivo de beneficiar alguém em específico, o resultado desta ação pode acabar sendo contrário ao pretendido. Vale lembrar: na renúncia, o quinhão hereditário volta ao monte da partilha e será redividido. Na cessão, é possível beneficiar alguém em específico.
É também preciso observar que tanto a renúncia, quanto a cessão, somente podem ser feitas após a abertura da sucessão, ou seja, após o falecimento do titular dos bens a serem herdados (também chamado juridicamente de autor da herança), já que a lei veda qualquer pacto sucessório referente a bens de pessoa ainda viva (Art. 426, do Código Civil). Logo, apesar de ser possível planejar as providências para o futuro, não é possível de fato renunciar ou ceder a herança até que o titular dos bens venha a óbito.
Por fim, é relevante destacar que sendo feita uma renúncia abdicativa, ou seja, retornando o quinhão ao monte para ser redividido entre os demais herdeiros, o renunciante não estará obrigado a recolher o Imposto Sobre Doações e Causa Mortis (ITCD), visto que não chegou a receber sua herança. O ITCD será cobrado apenas dos demais herdeiros, na proporção dos quinhões recebidos, inclusive considerando o quinhão renunciado que retornou ao monte da partilha.
Cessão onerosa ou gratuita
Por outro lado, se feita a cessão por doação a outro herdeiro específico ou a terceiros, o ITCD será cobrado uma ou duas vezes, a depender de como for feita a cessão (onerosa ou gratuitamente). Se a cessão for feita de forma onerosa, o herdeiro cedente será responsável por pagar o imposto incidente sobre o seu quinhão, já que antes de ceder, terá recebido a herança. Já se a cessão for gratuita, ou seja, feita por doação, primeiro, o herdeiro cedente será responsável por pagar o imposto incidente sobre o seu quinhão e, na sequência, o herdeiro ou terceiro cessionário precisará recolher o ITCD sobre o quinhão recebido, visto que recebeu bens de forma gratuita.
Assim, para fins de planejamento patrimonial, mesmo que durante o processo de inventário, é fundamental analisar não só a modalidade de transmissão do quinhão que se pretende utilizar (renúncia ou cessão), bem como, optando-se pela cessão, a forma como será feita (onerosa ou gratuita) e a repercussão financeira e tributária desta escolha.
O Portugal Vilela Advogados conta com uma equipe especializada em Planejamento Patrimonial e Direito das Sucessões e está à disposição para esclarecimentos.