Já se passaram 20 anos desde a consideração de constitucionalidade da Lei de Arbitragem pelo Supremo Tribunal Federal, mas no âmbito dos tribunais ainda são numerosas as discussões quanto à coordenação de jurisdições para apreciação de disputas advindas de contratos que contêm cláusulas compromissórias.
Este artigo trata especificamente sobre a coexistência entre os juízos estatal e arbitral no contexto do processo de execução que, diante da apresentação de defesa pelo executado, caberá ao juízo estatal suspender a execução em curso e não determinar a sua extinção.
Arbitragem não impede início da Ação de Execução
A contratação entre as partes da cláusula arbitral possui caráter obrigatório, o que determina a competência do juízo arbitral para resolver conflitos relativos a direitos patrimoniais – em um primeiro momento afastando a jurisdição estatal.
De início, a previsão de cláusula arbitral em contrato não implica impedimento para que se promova a execução de título extrajudicial perante o juízo estatal.
Isto se dá porque o juízo estatal é o único capaz de realizar remoção de bens no patrimônio alheio. A atividade executiva não se configura típica dos árbitros, competentes apenas para o ‘acertamento’ do direito.
Portanto, se o contrato configura, por si só e por suas garantias, um título executivo extrajudicial, o credor não fica com receio de executá-lo judicialmente, mesmo existindo convenção de arbitragem.
Limitação à atribuição do Juízo Estatal na Execução
Por outro lado, se os argumentos de defesa do devedor se relacionarem com o mérito do título executivo em que está inserida a cláusula arbitral, só o juízo arbitral será o competente para sua análise.
Com relação à discussão desse artigo, a existência de cláusula compromissória, que tira do Tribunal Arbitral a apreciação da matéria relativa à eficácia contratual e ao preenchimento dos requisitos do título executivo, o Juízo Estatal não será competente para resolver questões relativas à existência, constituição ou extinção do crédito objeto do título executivo ou às obrigações nele registradas, fazendo com que a controvérsia seja solucionada apenas pela via arbitral.
Isto quer dizer que, caso a execução de título extrajudicial com previsão de cláusula arbitral seja impugnada, a jurisdição estatal estará materialmente limitada para a análise da ação executiva.
Deve-se priorizar a Suspensão em relação à Extinção da Ação Executiva
Do ponto de vista prático, a suspensão do processo raramente é desejada, já que ela acarreta a paralisação e demora na solução da demanda. No entanto, em alguns momentos é fundamental ou até benéfico que a ação fique paralisada por algum momento.
Entretanto, caso a impugnação apresentada pelo executado na Justiça estatal se tratar de requisito de existência do título executivo, questionando, por exemplo, a validade do contrato, fica inviável o prosseguimento da ação de execução antes da solução de mérito pelo juízo arbitral.
É importante ressaltar que se o procedimento arbitral for instaurado para discussão de requisitos contratuais, está demonstrada a causa de prejudicialidade para manutenção da execução em seu curso normal.
Além disso, é preciso reconhecer que a dívida não será quitada enquanto está pendente o procedimento arbitral. Esta conclusão permite a liberação de bens que se pertencerem ao devedor, foram penhorados no curso do processo executivo, desde que o executado apresente uma garantia idônea ao juízo.
É certo que quando a paralisação temporária do processo for suficiente para o seu retorno regular no futuro, ele deverá ser suspenso, e não extinto.
Esse é o entendimento da terceira e da quarta turma do Superior Tribunal de Justiça.
Estabeleceu o entendimento a respeito da possibilidade de coexistência entre o juízo estatal e arbitral em caso de oposição de embargos à execução e/ou exceção de pré-executividade pelo devedor.
Assim, caso o devedor pretenda tratar de questões formais do título ou relativas a atos executivos, caberá a oposição de embargos à execução e/ou de exceção de pré-executividade perante o juiz togado e se ele tiver a intenção de levantar questões relativas ao próprio mérito do título executivo, a via arbitral deverá ser observada.
Para isso, a execução tem que ser suspensa e permanecerá nesse estado até que as questões referentes ao título executivo, na qual está inserida, sejam resolvidas pelo juízo arbitral.
É fundamental destacar que o Juiz poderá realizar atos que tenham urgência ou que possam causar algum dano irreparável, mesmo que o processo se encontre suspenso. Com exceção das hipóteses de impedimento ou suspeição previstas no inciso III do art. 313.
Art. 314. Durante a suspensão é vedado praticar qualquer ato processual, podendo o juiz, todavia, determinar a realização de atos urgentes a fim de evitar dano irreparável, salvo no caso de arguição de impedimento e de suspeição.”
De todo modo, é evidente que uma decisão pode ser concedida pelo Poder Judiciário em caráter provisório, considerando a natureza jurídica do pedido. Vale lembrar o artigo 22-A da Lei de Arbitragem, que estabelece a competência do Poder Judiciário para apreciação de medidas cautelares ou de urgência, antes que a arbitragem seja instituída.
Por esse motivo soa estranha a determinação de suspensão do processo até uma decisão final pelo Tribunal Arbitral, já que caberá a eles, no início do procedimento, decidir pela manutenção ou revogação de eventual determinação de suspensão exarada pelo Poder Judiciário, destacando à disposição do artigo 22-B também da Lei de Arbitragem[3].
Isso sem considerar a possibilidade de as partes contarem com a figura do árbitro de emergência, ou mesmo da competência do presidente da câmara arbitral para decidir a esse respeito antes da constituição do Tribunal Arbitral, dependendo das previsões dos respectivos regulamentos.
A equipe do Portugal Vilela – Direito de Negócios conta com diversos especialistas em arbitragem em contratos. Em caso de dúvidas, estamos à disposição.