O RAT é uma contribuição previdenciária paga pelo empregador com a finalidade de arcar com os custos dos trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho ou de doenças ocupacionais. Ou seja, trata-se de financiamento de indenização concedida aos trabalhadores de acordo com o risco de incapacidade laborativa.
Além das alíquotas normais de contribuição do RAT, que variam de 1% a 3%, dependendo do grau de risco das atividades da empresa e que incidem sobre o valor total de remunerações pagas pela empresa, existem alíquotas adicionais do RAT, de 12%, 9% ou 6% que incidem sobre a remuneração dos empregados que exerçam atividades que ensejam a aposentadoria especial com 15, 20 ou 25 anos de trabalho.
Ocorre que o STF, no julgamento do ARE nº 664.335 (Tema 555), com repercussão geral, fixou a tese de que se o empregador fornece equipamento de proteção individual (EPI) eficaz ao empregado, reduzindo a zero qualquer risco relativo a atividade laboral, este não tem direito a aposentadoria especial prevista no artigo 201, §1º da Constituição Federal. Nessa tese, entretanto, foi ressalvado, de forma expressa, os casos dos empregados expostos a ruídos, nos seguintes termos: “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria”.
Com base nesse entendimento do STF, em setembro de 2019, a Receita Federal declarou, através do Ato Declaratório Interpretativo (ADI) nº 2 que “ainda que haja adoção de medidas de proteção coletiva ou individual que neutralizem ou reduzam o grau de exposição do trabalhador a níveis legais de tolerância, a contribuição social adicional para o custeio da aposentadoria especial de que trata o art. 292 da Instrução Normativa RFB nº 971, de 13 de novembro de 2009, é devida pela empresa, ou a ela equiparado, em relação à remuneração paga, devida ou creditada ao segurado empregado, trabalhador avulso ou cooperado de cooperativa de produção, sujeito a condições especiais, nos casos em que não puder ser afastada a concessão da aposentadoria especial, conforme dispõe o § 2º do art. 293 da referida Instrução Normativa”
Nesse contexto, após a publicação do ADI nº 2 de 2019, a Receita Federal passou a considerar que mesmo que o empregador forneça EPI eficaz a ponto de reduzir a níveis toleráveis a nocividade do ambiente de trabalho insalubre, o empregado terá direito a aposentadoria especial. Ou seja, se há direito a aposentadoria especial conferida ao empregado, haverá por parte do empregador a obrigação de recolhimento de contribuição adicional aos Riscos Ambientais do Trabalho (RAT).
Desse modo, com base no ADI acima citado, a Receita Federal, já no ano de 2019, segundo dados fornecidos pelo próprio órgão fazendário, identificou “6.769 estabelecimentos do setor do comércio varejista de combustíveis, que não fizeram o recolhimento do adicional para aposentadoria especial, mesmo tendo trabalhadores expostos a agente tóxico. Os contribuintes foram objeto de ação de Fape/Malha PJ, primeiramente com o envio de Carta para Autorregularização” (Relatório anual de fiscalização 2019)
Outrossim, segundo o Plano de Ação da Receita Federal do Brasil para 2020, este ano, seguindo o fluxo de trabalho da Receita Federal, “ocorrerá a continuidade da operação, objetivando verificar a adequação das empresas sujeitas ao referido adicional da contribuição previdenciária para financiamento da aposentadoria especial, às normas vigentes”.
Nesse cenário de autuação por parte de Receita Federal, já se verifica decisões do CARF utilizando como fundamento para manter as autuações o entendimento do STF firmando no ARE 664.335.
A Receita Federal e o CARF, entretanto, não estão agindo de acordo com o entendimento fixado pelo STF, pois para ele, a eficácia comprovada do EPI é fator suficiente para elidir a obrigação do empregador de recolher o adicional ao RAT, com a ressalva apenas para os casos de insalubridade causada por ruídos.
Noutro giro, ainda que constatada a existência de autuações equivocadas por parte da Receita Federal, é absolutamente certo que os empregadores deverão implementar e manter uma rotina rigorosa quanto ao tema, implementando práticas que mantenham, de forma efetiva, a documentação sempre atualizada e garantam, através de uma orientação cuidadosa e uma fiscalização firme, que os empregados seguem as normas de segurança necessárias para as atividades exercidas por eles.
Assim, é essencial que as equipes de Recursos Humanos e da Segurança do Trabalho das empresas sejam chamadas para definir uma estratégia e liderar o trabalho que deve passar a ser contínuo, o que, vai permitir a defesa dos empregadores com argumentos bastante robustos tanto no caso de eventual fiscalização pela Receita Federal, quanto no caso de também eventual reclamatória trabalhista proposta por um (ex-)empregado.
Por fim, com base nos princípios da legalidade, irretroatividade, boa-fé objetiva, moralidade e segurança jurídica, mesmo nos casos dos empregadores autuados com base no ruído além do permitido, desde que tenham fornecido EPIs eficazes, dentro dos padrões exigidos pela legislação, é bastante plausível considerar e defender que eles não estariam sujeitos ao pagamento de qualquer recolhimento adicional do RAT, em relação ao período e aos fatos anteriores ao julgamento do ARE 664.335 pelo Supremo Tribunal Federal.