Elevação desproporcional do IGP-M e IGP-DI trazem desequilíbrio aos contratos de locação

IGP-M e IGP-DI

Em tempos atípicos, de uma pandemia que assola o mundo e sufoca a economia nacional, o IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado) e o IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna), que são os índices de reajuste mais comuns nos contratos de locação, passaram de 23% em 2020: O IGP-M fechou 2020 em 23,14%, e o IGP-DI subiu 23,08% no acumulado.

No contexto atual, o IGP-M e o IGP-DI acabaram perdendo a natureza de mera recomposição do valor do dinheiro (e do poder de compra), e se transformaram em verdadeira remuneração dos contratos, trazendo uma situação de onerosidade relevante para o curso das locações no ano de 2021.

IGP-M e o IGP-DI fogem à realidade das relações contratuais

Em um momento delicado da economia, diante da pandemia, fica claro que o IGP-M e o IGP-DI fogem à realidade das relações contratuais contratadas. Certamente não correspondem aos índices mais plausíveis para o momento atual.

Não se cogita aqui qualquer eventual descumprimento contratual, pelo contrário, os contratos devem ser cumpridos. Contudo, as situações não previstas à época da contratação, e que desequilibram os contratos, não podem ser deixadas de lado.

Sabe-se que, historicamente, os contratos de locação foram reajustados pelo IGP-M e pelo IGP-DI, uma vez que representavam um valor mais justo. A questão é que tais índices estão mais relacionados às commodities e ao dólar do que ao preço de mercado.

Observa-se, assim, que os fatores que afetaram a subida de tais índices, não estão ligados ao mercado imobiliário. A alta do dólar, por exemplo, não guarda qualquer relação com a locação de imóveis.

Contratos de locação precisam ser baseados por outros índices

Os contratos de locação pedem, no cenário de hoje, um reajuste baseado em uma realidade. Cabe apontar que o IPC (Índice de Preços ao Consumidor) acumulou uma alta de 5,64%, enquanto o INPC (Índice de Preços ao Consumidor) fechou em 5,52% e o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) em 4,52%.

Diante do desequilíbrio contratual instalado, nos aluguéis indexados ao IGP-M ao IGP-DI, já há um movimento de judicialização da questão, especialmente por parte de lojistas de Shoppings, com o objetivo de se fixar outro índice aos contratos.

O Poder Judiciário está longe de formar uma jurisprudência sobre a matéria

A título de ilustração, no âmbito do Poder Judiciário paulista, já houve decisão judicial recente[1] concedendo liminar alterando o índice usado no reajuste do aluguel, do IGP-DI para o IPC, exatamente sob o fundamento de uma majoração excessiva do contrato. Nos termos do entendimento judicial, a crise instaurada pela pandemia demanda medidas excepcionais para o reequilíbrio das relações contratuais.

A decisão foi objeto de recurso, e o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[2] proferiu decisão em sentido contrário, concedendo efeito suspensivo ao recurso do Shopping e revogando a medida liminar, ao entendimento de que a modificação do índice, antes do julgamento do mérito da ação, pode acarretar dano ao Shopping.

O mesmo Tribunal de Justiça já decidiu outros recursos sobre o tema[3], deferindo a substituição do IGP-M pelo IPCA, com apoio na crise decorrente da pandemia, que interferiu no equilíbrio das relações contratuais.

É certo que não há nos Tribunais, inclusive no Superior Tribunal de Justiça (STJ), um entendimento pacificado sobre o tema, seja no sentido de se levar a efeito a alta da inflação, atraindo a consequente modificação dos índices contratuais, seja no sentido de impossibilidade de revisão contratual.

A questão debatida (divergente no Poder Judiciário) pode até trazer uma interpretação favorável aos locatários, de modo a restabelecer o equilíbrio contratual. Entretanto, não se pode perder de vista que o aumento dos preços no período de pandemia também provocou perdas para os proprietários, ante a limitação de receitas, funcionamento, etc.

A viabilidade de eventuais teses deve considerar, então, as particularidades econômico-financeiras de cada caso.

A importância de medidas pré-contenciosas

Antes de se buscar uma solução judicial, o cenário deve ser bem verificado. A análise da situação contratual, bem como o histórico da relação entre as partes, mostra-se fundamental para se alcançar a melhor estratégia.

A busca da solução da controvérsia pode passar por medidas pré-contenciosas, que podem ser exitosas, evitando-se um litígio, mas podem ser importantes inclusive para uma estratégia judicial.

O panorama atual, de todo modo, aponta para um impasse instalado entre Locadores e Locatários acerca da questão, e cuja resolução vem caminhando através da busca por uma decisão judicial.



[1] Decisão proferida pelo Juízo da 12ª Vara Cível de São Paulo, autos nº 1000029-96.2021.8.26.0228

[2] 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo

[3] Agravos de Instrumento de nºs 2298701-80.2020.8.26.0000 e 2012910-93.2021.8.26.0000

Autor(a):

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Bruno Veloso Lago

Bacharelado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual Civil, pelo CAD – Centro de Atualização em Direito.
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